domingo, 8 de junho de 2014

CARTAS A MINHA FILHA Anne C.H. Santos carta 4 O jardim das rosas de Dona Odete e o abacateiro sonhador

. --A casa foi feita em mutirão. Juntaram-se os tios e tias e vinham aos fins de semana para ajudar a construir. Antes de morarmos ali na Avenida Marginal do Corrego da água podre, como era chamada a rua que depois se tornou Waldemar Roberto, moravamos na beira de um rio, numa favela perto da vila Dalva. Meu pai comprou com sacrificio, um terreno na beira de um rio e com mais sacrifício ainda, construiu um cômodo para entrarmos e moramos ali, todos, minha mãe, ele, eu, o Jaime, o Silvio e a Radinei. Do outro lado do rio, três barracos de gente que veio do nordeste e não tinha onde morar. Com o tempo os três barracos se multiplicaram exponencialmente e viraram milhares e o aglomerado deles passou a se chamar Favela do Sapé. Saímos de uma favela porque alugávamos um barraco para morar, veja que pobreza extrema, e quando conseguimos através de meu pai, sair para morar em uma casa própria, ergueu-se uma favela bem na frente de casa. Quando os tios vinham para ajudar bater a lage, rebocar as paredes, era uma grande alegria. O tio Heitor sempre foi o tio mais brincalhão do mundo e o tio "Einsten" da família. Sempre foi muito inteligente. Sabia muito de historia e de muitas outras coisas. Me lembro que ele quem me ensinou a bater prego com o martelo. -Segura mais na ponta do cabo e o peso todo do martelo vai fazer um trabalho mais eficiente. Se você segura muito perto do martelo, a pancada é mais fraca e você vai levar mais tempo martelando. Eu adorava aprender as coisas com ele. Ele foi o tio que me ensinou a dirigir com seu fusquinha azul. Uma coisa tão importante dessas a gente nunca esquece. Ele arriscou sua vida e seu carro em minhas mãos de aprendiz em uma época que ainda não era crime um tio ensinar o sobrinho a dirigir. Quando ele e o tio Gessé iam em casa para ajudar na construção traziam os filhos era sempre muito legal. O tio Ulisses e a Tia Ica eu vim a conhecer depois. Também tios amáveis e maravilhosos. O terreno era grande, tinha uns 400 metros triangulares, pois era largo atras e mais fino na frente. Nesta casa eu creci e vi meus irmãos crescerem até onde conseguiram. Havia um quintal na frente onde minha mãe plantava suas flores. Ela adorava rosas. haviam ali roseiras de várias cores. Quando sinto cheiro de rosas lembro me dela. Ela era uma roseira em flor, mas sem espinhos. Ou um pássaro que cantarolava ao pousar por sobre as roseiras, apesar dos espinhos. Minha mãe vivia cantando. Sempre me lembro dela a cantarolar um hino de igreja. "Deixa a luz do céu entrar, abre bem a porta do teu coração..." era parte da letra. Hoje eu sinto esta letra muito mais profundamente que na época. Quando estou triste e sozinho, ou quando estou preocupado com as coisas da vida, me lebro da canção e canto para ninar meu próprio coração. Deus estava ali, dentro dela, porque ela fazia do seu canto uma celebração perpétua de seu Deus interno. Flores, cores, perfumes, ela hoje deve estar transformando a dimensão em que habita em um lindo jardim. Mas voltando ao quintal, havia também um abacateiro que eu mesmo plantei. Não deve existir mais porque o dono atual da casa deve ter cortado para que a casa não corresse perigo, mas era lindo. Assim que ele tomou corpo, eu subia nele para sonhar. Eu tinha uns 13 anos e Ficava lá em cima, meu mundinho particular, até as tantas da noite só pensando, sonhando com dias melhores.Até minha mãe me chamar: -Nado, desce dai, vem dormir. Aos 13 eu ja trabalhava com carteira assinada e sustentava minha familia. Trabalhava na Dempabras, uma empresa de projetos sei la do que, como office boy. Oficeboy era um "faz quase tudo e sabe quase nada" que as empresas contratavam para levar e trazer documentos, ir a bancos etc... Eu pensava em sair do pais, e saia do planeta viajando em minha mente por lugares que eu ia imaginando. Ver a lua dali daquele galho de abacateiro era o máximo. As estrelas num dia de céu limpo eram um espetáculo a parte. Elas piscavam lindamente e dançavam no céu. A noite ia seguindo em frente e eu ia revesando meu traseiro no galho do abacateiro para poder permanecer ali por mais tempo. Minha mente era de uma riqueza tão profunda de pensamentos que eu, se pudesse, nunca mais desceria daquele galho, meu refúgio na terra. Ali planejei minha viagem para outro pais quando nem imaginava que eu realmente iria. Ali eu tentava enxergar nem que fosse um milimetro do meu futuro para poder ter esperança. Alias, esperança foi algo que aprendi a ter com minha mãe. Não importa como, não importa quando, mas farei tal viagem um dia. E fiz mesmo. A adolescencia foi uma tremenda aventura. Um laboratório de vida e de experiências humanas que foi muito importante em minha vida. Eu realmente me sentia vivo e vivia cada segundo de minhas aventuras, nem que fosse uma aventura besta de pegar uma trilha no mato com o Bob, meu cachorro branco de nariz marrom. Eu sentia todos os cheiros, todas as cores, o vento na cara, o medo do escuro, os pingos da chuva, tudo, com muita, mas muita intencidade. Valorizo cada momento daquelas experiencias, das quais me lembro até hoje. É isto o que tenho hoje a dizer pra você minha querida Anne. Daqui do meu distante planeta, te envio muito boas energias. Namastê. O deus que habita em mim saúda o deus que habita em você

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Os legumes revoltados do vovô Nestor

Meu avô, Nestor Soares de Macedo era muito engraçado, tinha um humor levemente sarcástico, pelo que me lembro, mas não deixava de ser fantástico para os que com ele conviviam. Ele fazia brinquedos que eram palhacinhos de papelão que montava com ilhós e estes palhacinhos, conforme você puxava um cordão abriam os braços, mexiam as pernas e mostravam a lingua. Meu avô era sapateiro e também fazia cintos em época que você, para ter um, precisava encomendar no sapateiro. Pelo que me lembro ele teve sérios problemas de saúde por causa do cheiro da cola de sapateiro. O que os moleques de rua querem cheirar para dar barato, meu avô cheirava sem querer e sem poder, pois tinha bronquite asmático e ficava muito mal as vêzes. Mas, ele, pelo que me lembro amava muito minha avó e fazia coisas engraçadas para ela rir. Me lembro de um episódio em que ele, para mostrar a revolta dos legumes que não estavam sendo utilizados na geladeira e que estavam murchos, pegou um xuxu, uma batata, uma cenoura, uma beterraba e entalhou algumas formas. O xuxu ficou parecendo um jacaré, dos outros eu não me lembro, mas ficaram todos com alguma carinha engraçada. Os pés ele fez com palitos de fósforo e palitos de dente. Todos os vegetais entalhados seguravam uma plaquinha onde estava escrito: "Não me quis, vou-me embora" ou "tchau, ingratos!" ou algo assim. Depois ele colocou em fila, alguns segurando uma trouxinha, como a sair da geladeira, no chão. Não sei quando ele entalhou, mas lembro-me que, pela manhã, lá estava a fila de vegetais revoltados indo embora. Minha avó riu muito quando viu. Eu, sinceramente pensei que ia sair briga porque afinal era uma forma de dizer que ela não havia utilizado os vegetais. Mas creio que ela não aguentou a palhaçada e começou a rir. Tem muitas outras histórias sobre meu avô que vou contar por aqui. Ele era um velhinho muito querido pelos netos. Sempre que ia em casa, dava um dinheirinho para os netos. Me lembro da época em que um cruzeiro dava para comprar 10 doces. E adivinha o que eu fazia? Comprava 10 doces com o um cruzeiro que meu avô me dava e não dava nenhum pedaço para ninguém. Meu irmão também ganhava e eu não lembro bem, mas acho que ele poupava para comprar outras coisas depois. Mas o meu dinheiro eu comprava tudo de doces. Haviam doces que vinham com brinquedos, era fascinante sentir todos aqueles sabores e ainda ficar com os aviõesinhos de plástico e os soldadinhos que vinham enfiados nos doces. Mas me deixem terminar por aqui a história dos vegetais revoltados do meu avô e até a próxima história.

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Uma aventura na selva rondoniense


Foi lá pelos anos 80, não sei qual foi o mês que resolvi ir ver meu velho que morava perto de uma cidade de Rondônia que se chama Vilhena. Eu trabalhava na época na Eletropaulo em osasco e consegui pegar férias de 30 dias para empreender minha viagem. Para mim era tudo novo. Pegar um ônibus que atravessaria o pais passando por alguns estados era algo que eu nunca havia feito antes. Levava simplesmente 3 dias e 3 noites para chegar a Vilhena. Metade da estrada era de asfalto e a outra metade de terra. De vez em quando chovia e todos tinham que descer do ônibus para desatolá-lo empurrando.
. Durante a viagem um veado foi atropelado. Os passageiros desceram e tiraram seu couro e repartiram a carne para assarem mais tarde. Paramos em Mato Grosso e tive que dormir em uma pensão por lá porque o ônibus que continuaria a viagem só sairia no dia seguinte. Cheguei em Vilhena e tomei uma vacina logo na entrada da cidade. Na época nem me liguei que estava entrando num lugar onde certas doenças como a malária e a febre amarela eram comuns. Ao chegar na rodoviãria, pedi ao moto-taxi que me levasse até a casa de ferragens do Sr. Hélio. Ele era um amigo de meu pai e poderia me dizer se o velho estava na cidade ou na mata que chamava de fazenda. Pedi ajuda a um pessoal de uma igreja Batista e eles me deram guarida até que eu achasse meu pai. Todos os dias eu passava na casa de ferragens e perguntava ao Sr. Helio se ele havia visto meu pai. Ele sempre me dizia que ainda não, até um dia em que ele disse: -Seu pai acabou de sair daqui.Corra pela rua que você o encontra. Corri pela rua apressado, até ver meu velho, andando com seus passos firmes e duros e suas mãos de um jeito que era só ele que mantinha quando andava. Mais tarde me peguei copiando tal gesto sem querer, mas me lembrei de meu pai. -Hei pai! -Mas não é que o "cú de seda" veio me ver mesmo? -Pô pai, que linguajar é este? -Não liga não, me dá um abraço.... Abracei meu pai e fiquei impressionado com o aperto que ele me deu. Ficamos alguns dias na cidade ainda. Depois meu pai me levou para o mato, como eles dizem lá. Pegamos um ônibus que ele chamava de "poeirinha" que nos levaria até o Rio Cachoeiro. Descemos num restaurante que ficava a beira da estrada. De lá caminhamos, a noite por 16 quilometros intermináveis para chegar a um rancho que ainda não era o do meu pai. O vizinho nos recebeu com um café quente e um pedaço de bolo. Saimos ainda a noite e continuamos a caminhada. Meu pai olhava para o chão e apontava : Aqui passou uma onça, olha o tamanho desta pegada! -Para que você está me assustando velho... -Velho é sua vó... -Tá bom, não te chamo mais de velho, mas vê se para de me assustar. -Não tenha medo de bicho rapaz, tenha medo de gente. Bicho não ataca por nada, só se esiver com muita fome ou acoado. -Eu espero que esta onça não esteja com fome mesmo. -Bom, fica sossegado que tem muita vaca no pasto para elas pegarem. Chegamos em fim ao rancho de sapé onde meu pai morava.A lua era maravilhosa, clareava tudo, nem precisava de lanternas.
Fomos dormir. A tapera não tinha folha de janela para fechar, a porta não trancava, só encostava. Perguntei ao meu pai se ele não tinha medo de algum bicho entrar. ele novamente repetiu: Tenho medo do bicho homem, do resto eu não tenho não. Dormi com dificuldade naquele dia. Durante a noite meu pai teve febre. Perguntei o que ele tinha e respondeu que era malária. Mas que era normal aquela febre. Ele estava tratando com um comprimido de quinino que era dado pela sudene, mas tinha acabado. Ele tinha que ir num posto buscar e eu iria com ele lá. Era um vizinho que fazia a distribuição, mas a palavra vizinho não tem para os mateiros o mesmo significado que tem para os seres urbanos. Vizinho lá siginifica a"a casa mais proxima" que pode ficar de 2 a mais quilometros longe. Um dos dias meu velho me propôs que fossemos para uma área das terras que ele não conhecia muito bem. Era noite e no dia seguinte levantariamos cedo e partiriamos munidos apenas de um embornal com um bolo que ele sabia fazer na frigideira, um pouco de café numa garrafa térmica, um isqueiro e um pouco de resina que ele tirou de uma árvore. Acordamos cedo e logo saímos ainda com o sol raiando. Conforme iamos caminhando ele ia me falando: Esta árvore aqui se chama Pau de Macaco. Da casca dela você faz um chá que é bom para reumatismo. Ali temos uma planta que se chama chapéu de couro. o chá dela é também muito bom para reumatismo, para limpar o sangue. Não me atenho a detalhes do que ele ia falando porque faz muito tempo e realmente não lembro do nomes de todas as árvores e doenças que eles pretensamente curariam com seus chás. Me lembro no entanto que ele pediu que ele parasse debaixo de uma pequena árvore e ficasse ali por um instante. ele balançou a árvore e choveu formigas das folhas, do caule, te todo lugar. Eu me bati até tirar as danadas do meu corpo. Entraram até em minha cueca. Eu ri porque não tinha o que dizer da brincadeira de mau gosto. -Seja homi, cú de seda! -Pai, para com isto. ser picado por formigas não faz de mim mais homem nem menos. -ai, maricão besta é tu heim... Bom, sei que andamos durante o dia inteiro até que ele admitiu que estava perdido. Estava seguindo o curso do rio mas tivemos que cortar caminho por um lugar mais aberto e pronto, ele disse que se perdeu. Dormiriamos na mata. Havia chovido. -descansaremos depois destas samambaias. Ele apontou para um matagal de samambaias que dava mais do que a altura de um homem. -Mas como atravessaremos esta mata de samambaias? -Nadando por cima é claro. Vai, sobe no colchão e nada. Foi o que eu fiz, imaginando que no meio daquele colchão de samambaias poderia ter tudo quanto é tipo de bicho, mas copiei seus movimentos e por fim, com muito custo, passei ao outro lado das samambaias. -Acamparemos aqui, disse ele. -Aqui pai? Mas dá para fazer uma fogueira? -Claro que sim. Pegue esta resina e junte um pouco de madeira que acenderemos um fogo. -Mas a madeira está molhada. Andou chovendo. -Sim, mas veja aqui, esta resina pega fogo mesmo assim. O fato é que em alguns momentos havia um pequeno fogo. Saia muita fumaça, o que era bom porque espantava os mosquitos. Mas eu passaria o resto da noite assoprando o fogo e pondo mais madeiras para que o fogo jamais se apagasse. Meu pai simplesmente tirou a roupa, pendurou num pau que enfincou no chão, juntou algumas folhas velhas no chão e dormiu a noite inteira como uma criança em cima do montouro de folhas. Eu havia cortado o dedo meio feio até chegar até ali. Eu tinha levado um facão que quebrou o cabo e tentei improvisar um cabo enrolando uma folha de bananeira no aço do facão que ficou exposto por falta do cabo. Quando fui subir em um morrinho, usei o facão para me apoiar e ao escorregar, cortei feio entre o dedo mindinho e o seu vizinho. Sangrou muito e fui obrigado a rasgar um pedaço da camiseta para enrolar o dedo. Só andei até ali com a mão para cima, para o dedo não sangrar mais. Foi assim que passei a noite no meio da floresta. Dedo cortado, ouvindo barulhos de todos os lados e pensando que era onça e meu velho ali, socegado dormindo. No dia seguinte, meu pai acordou como se estivesse acordado em sua casa. Levantou e disse. -Agora ouço o rio, sei que ele está para lá. vamos por ali. andamos no meio da mata passando por várzeas onde eu tinha que mergulhar por baixo de galhos de árvores para poder passar. Lama até o pescoço. Depois de um tempo de caminhada, finalmente chegamos na tapera de volta. A que vocês podem ver na foto acima. Dai, fiz um curativo menos pior do que o anterior e queria dormir. Meu pai não queria. Não tinha sono porque dormira bem a noite toda. Ele queria ir á casa de um vizinho fazer uma visita. Ele me deu uma pinguinha quando chegamos a casa por causa do frio que passei. Ele tomou da pinguinha também e ficou meio chapado. Dai ele tentou me carregar nas costas para chegar até o vizinho.Mas não deu jogo. Por fim resolveu me deixar em paz para dormir. Dormi então no calor do dia, como se dorme depois de uma noite em claro na mata. Essa foi parte de minha aventura em Rondônia com meu velho pagé e mago. Depois eu conto mais.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Da série "O Herói negro" Capitulo 1

Capitulo 1 Primeira lição, o aviãozinho azul O pai gostava do pequeno a seu modo. Como dizem os antigos, os brutos também amam. As vezes chegava em casa com uma ou duas cachaças a mais na cabeça e, em estado de alegria exagerada, começava a brincar com o pequeno.Jogava-o para cima e o agarrava antes da queda. Isto fazia o pequeno estremecer com o frio na barriga que sentia cada vez que descia e era aparado pelo pai antes da queda.Mas ele no fundo gostava de voar nos braços dele. As vezes a brincadeira era outra. A de enrolar na coberta e não deixar sair. O pai segurava as pontas do cobertor de modo que o pequeno ficava como um peixe dentro da rede. O menino detestava esta brincadeira, mas sabia que o pai não fazia por mau, ele era bruto assim mesmo. As vezes, quando o pequeno chorava sufocado no meio das cobertas, o pai o soltava e dizia. ----Vixi, que marica chorona. Seja homi muleque! Mas nem tudo eram só brincadeiras brutas. Quando o pai colocava o pequeno de cavalinho no ombro, o pequeno adorava. Ás vezes o pai levava o pequeno na cidade. A principio eles iam andando pela estradinha de terra, mas quando o pai via que o pequeno estava cansado e começava a diminuir o passo, colocava-o no ombro e lá iam os dois para a cidade. O pai sempre tentando ensinar alguma coisa ao pequeno. ----Muleque, dizia ele, você tem que aprender mais do que eu para não ser um burro de carga como eu sou. Sai da Bahia ainda muito moço. Queria estudar mas meu pai não deixava, dizia que não podia pagar meus estudos e que eu era mais útil capinando no roçado. Meu irmão, Porfírio, este sim estudou ás custas do velho, virou advogado.Mas eu tive que sair de lá fugido e vir para São Paulo para tentar estudar e ser gente. Mesmo assim só consigo escrever pouco... e assim o pai prosseguia numa conversa cumprida que dava até gosto. O pequeno ouvindo tudo calado. O pai falava sobre a época de plantio da cebola, das hortaliças, sobre as diversas luas. Lua para plantar, lua para podar, lua para colher. Segundo o pai, se alguém plantasse as coisas em lua errada, não colhia era nada. O pequeno ficava imaginando a lua como uma rainha que mandava na plantação. ---Agora pode crescer. ---Agora não pode. Mas como é que a lua lá do céu podia mandar nas plantas aqui na terra? Será que a lua falava? Mas ele não perguntava nada disto ao pai com medo do pai dizer que ele era burro feito o Jaime, seu irmão mais velho. Vira e meche o pai falava mal do Jaime. Disto o pequeno não gostava. O pai dizia que o Jaime era vagabundo e que isto estava no sangue. O pequeno ficava mesmo era com raiva do pai quando falava mal do Jaime, seu herói. Mas não dizia um “a” não, que era para o pai não chama-lo de burro. Burro é que ele não era. As vezes o pai parava de falar mau do Jaime e falava do presente que iam comprar para a mãe na feira lá em São João Novo. O pai podia ser bruto mas nas datas especiais sempre dava um presente para a mãe. Mesmo que o dinheiro tivesse muito curto e escasso, para um presentinho sempre se dava um jeito. No caminho para São João Novo, tinha uma venda onde o pai sempre parava e dava ao menino um ou dois copos de Tubaina. Era bom. Vinha cheia de bolinhas de ar dentro. Quando descia pela garganta, chegava queimar . Depois de alguns goles vinha a vontade de arrotar....e o menino dava um arroto com cheiro de tutti-frutti. Depois de prosear um pouco com o dono do bar, o pai punha novamente o menino no ombro e ia estrada afora para o centro de São João Novo. Enquanto se afastavam do bar, no alto falante sempre tocava uma ou outra musica do Roberto Carlos. Naquele dia estava tocando a musica que dizia: “Eu prefiro as curvas, da estrada de Santos, onde eu posso esquecer....”e o pequeno ia olhando os barrancões de terra vermelha a beira da estrada curva, e imaginando que o homem que cantava devia estar falando daquela estrada ali mesmo. Devia ser domingo, pois o pai só o levava a passear de domingo. Ao chegarem naquele dia na feira do centro que ficava perto da estação de trem, o menino ficou maravilhado com tanta coisa que podia ver de cima dos ombros do pai. Frutas, tinha todas. Algumas que ele nunca havia provado. —Qué uma banana muleque? Dizia o pai parando numa barraca de frutas. É claro que o menino dizia que sim, adorava frutas. O cheiro das frutas era coisa mágica. Eram mesmo cheiro de domingo e de feira.Fruta em casa era coisa rara. Então era melhor aproveitar as bondades do pai enquanto ele não mudasse de idéia.Era bom sentir que o pai mesmo tendo seu jeito bruto cuidava dele dando-lhe tubaina e frutas. Os outros meninos não gozavam de tal regalia. O Silvio porque era coxo e não podia andar muito sem sentir dores na coluna; O Jaime porque o pai parecia lhe ter uma certa antipatia. O menino então, como era menor, mais portátil, mais quietinho e menos levado era sempre a companhia do pai na ida a São João Novo. Além da barraca de frutas, havia também muitas barracas com tecidos de todas as cores, redes de dormir, bolsas, cacarecos de cozinha e uma que chamou mais a atenção do guri, a barraca de brinquedos de plástico. Como fascina os homens o plástico. Usam para tudo e querem cada vez mais obter coisas de plástico para levarem para casa mesmo que as usem por pouco tempo e depois as abandonem pelos céculos que elas duram. Mas, o que deixava o garoto com muita vontade de ter aqueles brinquedos de plástico era mais a cor chamativa dos brinquedos do que o próprio brinquedo. Ainda no ombro do pai o menino aproveitou o máximo que pode os poucos segundos em que o pai passou pela banca de brinquedos e se deleitou com a visão privilegiada do alto de um ombro. Seus olhos tatearam cada brinquedo, cada plástico colorido, até focarem um lindo aviãozinho azul. Poxa, se ele pudesse ter aquele aviãozinho. Mas é claro que o pai nunca iria comprar um brinquedo para ele. Então para não levar um não, ele não pediu foi nada. Só acompanhou com a cabeça virada para trás, o quanto pode, a imagem do aviãozinho ali na banca. Quando chegasse em casa ele diria para a mãe o quanto quis ter o aviãozinho, mas o pai, nem quis comprar.Quem sabe a mãe dava um jeito e fazia o pão duro do pai comprar o objeto dos seus desejos. A relação que tinha com o pai era de amor, respeito e medo. Sabia que o pai para lhe esquentar o trazeiro, caso fizesse algo fora dos conformes não custava nada. Então ficava o mais quieto possível. Pelo menos assim tinha certeza de que não iria apanhar do pai por falar coisa errada. Assim, passaram pela feira.O pai comprou um corte de pano para que a mãe fizesse um vestido para ela. Achou que este era um bom presente para o dia das mães. Depois de fazer as compras necessárias para a semana, colocou novamente o guri nas costas e voltou para o sitio onde chegou perto do meio dia. O menino ficava admirado com a força do pai. Como é que ele agüentava carrega-lo tanto em cima dos ombros. Só as vezes, o pai parava e colocava o menino no chão para que andasse um pouco . A fome ia aumentando a cada passo que davam. ---Deixa de ser marica rapaiz, vamo, anda..... falava o pai quando o menino diminuía o passo. Um passo do pai sempre equivalia a muitos do filho. Ele era para o menino um gigante e não conseguia acompanha-lo. Mas quando o pai perdia a paciência, punha o menino nas costas de novo e caminhava mais um tantão.O pai além de carregar o menino, também levava duas sacolas com as compras que fizera. E assim chegaram ao Sitio do Expedicionario. O menino conhecia de longe que tinham chegado porque avistava o pinheiro enorme que tinha na frente da casa amarela à beira da estrada. Os cachorros tantos que havia no sitio vinham logo ao encontro do pai, talvez para ver se ele lhes dava um pouco do jabá que comprara. Vinham que vinham balançando o rabinho. Os patos e gansos ficavam no quintal revirando a laminha da água que vinha da pia para ver se achavam um arrozinho para comerem. Assim como os patos, distraídos com os afazeres de rotina, pareciam estar todos da casa, até que o pai dava um grito ----Ôooooo! Daí logo o Jaime e o Silvio vinham ver se o pai trouxe balas ou pãozinho da venda. A mãe, arrastando os sapatos do aparelho ortopédico também vinha para fora de muletas, receber seus guerreiros com o carinho que só ela sabia oferecer. ---Então meus anjos, foram bem de passeio? ----Bem o que mãe? O pai não quis nem comprar o aviãozinho azul que tinha lá na feira pra mim.... ----Mas o que você ta falando muleque? Que diabo de aviãozinho era este que eu nem vi? ----Lá na banca de brinquedo de plástico pai, tinha sim, um aviãozinho azul. ----Mas porque você não falou na hora moleque? Porque não pediu? -----Eu sabia que o senhor não ia comprar mesmo. ----Podia até ter comprado, mas você não pediu, quem não chora não mama muleque.... ----Deixa pra lá né filho, depois o papai compra o avioãozinho pra você, disse a mãe piscando para o pai para apaziguar o garoto que já sentia o nariz doer como se tivesse levado um soco e uma lagrima correr nos olhos. Por que é que não pedira? A esta hora estaria brincando com seu aviãozinho azul.

A mala do vovô Isaias

Este é meu pai, Isaias Alves dos Santos e suas duas cobras. Esta historia contei para a minha filha Anne, num daqueles dias em que ela me pediu para contar uma historinha para ela dormir. Anne...Se quer uma história, então la vai: Quando o seu vovô Isaias veio de Mato Grosso para casa de sua bisavó,dona Anália, trouxe consigo uma mala marrom daquelas bem antigas, parecia até uma mala de madeira pois era feita de comprensado ou algo parecido. Ele havia ido até a mata em que morava, no Mato Grosso, supostamente para buscar o Xangô, que era o gato de estimação do tio Silvio. Quando eles mudaram, o gato fugiu do caminhão bem na hora da partida e ficou para traz deixando tio Silvio muito triste. Bom, o fato é que o vovô Isaias gostava muito de animais e disse que, como tinha que pegar umas coisas que deixara ''lá no mato'' então traria também o Xangô. Quando o tio silvio, que era muito pequeno na época, viu o pai com aquela mala, ficou muito contente e, otimista que era, logo arriscou....----O Xangô tá ai nesta mala não é? --Claro - Disse o vovô Isaias, com uma risadinha meio estranha, precisamos tira-lo logo daqui, a mala está muito quente para ele. ---Então vamos tirar logo o gato da mala, disse o bisavô Nestor, o coitado deve estar louco para sair dai, já pensou, uma viajem destas dentro de uma mala apertada.... --Sim, vamos tirá-lo, mas tem uma coisa seu Nestor, o Senhor tem que abrir a mala e enfiar a mão dentro e pegá-lo, se não, do jeito que ele está assustado vai pular na sua roupa e grudar no senhor e pode até machuca-lo. ---Está bem, abra a mala que eu pego o gato. ---Ta bem, vou abrir uma frestinha e o senhor enfia a mão e pega.... Quando o vovô Isaias abriu a mala, o Bisavô Nestor fez como o combinado, enfiou a mão para pegar o gato e ...ao invés de sentir o corpo do gato quentinho, sentiu alguma coisa gelada em suas mãos.... De dentro da mala então começou a sair uma enorme cobra, a Gigi, cobra de estimação do vovô Isaias e o bisavô Nestor então subiu logo em cima da pia, a tia Sonia subiu em cima do guarda roupa, a vovó Odete, como não podia correr por ser paraplégica, gritava sem parar....e o Tio Silvio, ele então desandou a correr pelo corredor da casa a fora. Bom, passado o susto,e controlada a Gigi pelo vovô Isaias vieram á luz os fatos. O vovô havia trazido a Gigi porque queria ganhar dinheiro com ela exibindo-a na praça para as pessoas e assim, depois de coloca-la no pescoço e mostrar que a Gigi não lhe fazia mal nenhum, poderia passar o chapéu, recolhendo dinheiro pela demonstração. Ao fim nada disto deu certo. A Gigi começou a ficar doente e passar mau e o vovô foi obrigado a soltá-lo em um rio que hoje passa embaixo da av. Luis Carlos Berrini, ali no Brooklin. Esta foi contada e recontada pela vovó Odete , que gostava muito de crianças e certamente gostaria muito de te ter conhecido Anne.

Odete Soares dos Santos, a costureira que contava historias

Historia de Odete Soares dos Santos por ela mesma. Vovó Odete conta um pouco de sua infância. Adaptação de Anne e Rudi Santos Estes escritos foram encontrados por mim ha pouco tempo no meio de algumas de minhas coisas. Lembro-me que quando ouvia as historias de minha mãe eu sempre lhe dizia que sua vida daria um livro bem interessante. Eu havia feito uns cadernos com folhas de rascunho que a Eletropaulo, empresa em que eu trabalhava na época, jogaria fora. Dei um destes cadernos a minha mãe e lhe pedi que escrevesse ali o que se lembrasse de sua infância até o presente momento. O que lerão abaixo foi o resultado deste meu pedido. Estou passando aos poucos para arquivo eletrônico, junto com a Anne, minha filha. Portanto, se ainda não leram o capitulo final, aguardem até que possamos continuar a transcrever a história. Rudi Santos Capítulo 1 O Primo Mamãe tinha um primo que morava em Rio Claro, chamava-se Erasmo Meirelis que era casado com dona Ritinha e tinha 2 filhos. Ele era dentista e mamãe de vez em quando nos levava na casa deles, era uma casa grande,em uma chácara muito bonita,que tinha um pomar maravilhoso com muitas fruteiras e mangueiras enormes.Tinha balanço de corrente e nós adorávamos ir lá só para brincarmos na balança.Era uma delícia. A mangueira era alta e nós íamos na maior altura possíveldepois tomávamos leite, tirado na hora.Chegava a estar espumadinho.Comíamos frutas a vontade. Enfim era uma delícia ir na casa do primo Meirelis.Ele era um homem muito elegante,mas não era muito bonito.O casal também ia em minha casa e eu e meus irmãos brincávamos muito com suas filhas. O primo de minha mãe, começou a frequentar demais minha casa.A esposa dele não era bonita,era uma senhora de meia idade.O primo de minha mãe começou a cobiça- la, até que um dia eu, como sempre, ali pelo chão, nas minhas brincadeiras, vi quando o primo Meirelis ia chegando e disse para minha mãe.E ela não gostou.Apesar disso ela o recebeu bem. Ele, todo alegre, estava com um terno branco, e um sapato branco e preto muito bonito. Sentou-se em uma cadeira no quintal em frente a cozinha.Havia ali um pé de sabugueiro com um tronco bem grosso e todo cheio de flores.O primo Meirelis encostou a cadeira para trás apoiando no sabugueiro.Mamãe já tinha nos dado almoço.ofereceu para o primo e ele não quis.Mamãe começou a comer com o prato na mão.ela estava na porta e o primo recostado na cadeira.O primo começou a fazer galanteios para mamãe.Então ela foi falando para ele: --- Você precisa cuidar da sua família e respeitar a família dos outros. Ele cada vez mais falava coisas para mamãe.Ela foi ficando nervosa e quando viu que não tinha jeito de cortar o papo desagradável do primo,mandou o prato de comida no rosto dele. Ele deu um pulo da cadeira e a roupa dele ficou toda suja de caldo de feijão. --- E agora como vou sair na rua? --- perguntou o primo. Mamãe respondeu: ---Você ainda quer saber, como assim?quer ver? Ela pegou um pau e correu para cima dele.Ele saiu correndo, sumiu e nunca mais veio em casa.Nós nunca mais fomos na casa dele. Capítulo 2- Mamãe toda semana saia para entregar costuras. Ela começou a receber galanteios.Mamãe começou a ficar doente de tanto trabalhar. Passava mal a noite com o papai e não deixava o papai saber o que estava acontecendo. Então ela foi pegando uma estafa e deu crise nervosa. Papai resolveu nos levar para Macatuba. Lá fomos nós e nessa época vovô já estava bastante velho e vovó também. Quem dirigia a casa agora era minha tia Laura, a filha mais velha.Ela tinha 2 filhas e o marido, meu tio José Cordeiro. A filha mais velha chamava-se Isaura e a mais nova Onorina. A Onorina tinha o apelido de nenê. Quando chegamos o vovô soares e a vovó Maróca ficaram contentes do nos ver. A tia Laura, porém, não gostou muito de nossa chegada mas não podia nos rejeitar por causa de meus avós. Com isto, ficamos na casa de vovô mas não sabíamos o que nos esperava. Papai e mamãe voltaram para Rio Claro e foram dar um jeito de mudar para pederneiras que fica mais perto de Macatuba, cidade que, na época, chamava-se Bocaiúva. Minha tia, como não havia gostado de nossa chegada, logo foi mandando o Wilsom ir para a casa do Tio Esabilino, outro irmão de meu pai. Eu e a Ica ficamos com a vovó, mas a tia Laura, o que pode fazer de maldade para nós ela fez. Passamos muita fome porque tia Laura falava para meus avós que já tínhamos tomado café da manhã, por exemplo, e só havia dado café preto em uma canequinha de esmalte com um pedacinho de polenta que era feita para dar ao cachorro. No almoço, ela dava para minha prima um bonito prato de comida, com feijão, carne, batatas, verduras. Já para nós, dava angu do cachorro, com feijão bem aguado e serralha. Esta era nossa refeição. Não estávamos acostumadas a comer tão mal assim. Apesar de sermos tão pobres mamãe sempre criou galinhas. Tínhamos ovos, verduras que meu pai plantava e bebíamos leite de cabra que mamãe tirava todos os dias. Agora tínhamos que passar todos os dias só com angu mal feito, caldo de feijão e um pouco de café. Estava duro de agüentar e ainda por cima o Wilson ficou longe de nós e sentíamos a falta dele. Difícil também estava ficar longe de nossos pais mas, assim mesmo tentávamos nos distrair. Vovó pois a Ica na escola. Ela ia com minha prima o que ainda deixou o ambiente mais triste para mim. Quando a Ica voltava da escola ela sempre trazia uma florzinha e dava para mim. As vezes ela trazia um caco de louça bonitinho para nós brincarmos ou uma latinha bonita para nós fazermos comidinha.

Jaime de Lima e Silva em "o menino sonâmbulo e o bêbado"

O Jaime é o menino em frente a minha mãe a direita. Historia contada por mim para minha filha sobre um irmão adotivo e sumido que tenho. O tio Jaime estava dormindo e de repente a vovó Odete ouviu um barulho. Ela viu que era um bêbado tentando entrar na cozinha da casa e falou para o tio Jaime.
—Jaime, Jaime, vai fechar a porta.

O Tio Jaime, que andava dormindo pois era sonâmbulo foi lá, deu uma volta no quintal, provavelmente abraçou o bêbado e voltou.
Então a vovó Odete perguntou
—Jaime, você já fechou a porta?
--- Não Mãe....
---Então vai lá menino, fecha a porta que o bêbado vai entrar aqui em casa pensando que é o banheiro...
Lá foi o Tio Jaime de novo pela porta a fora, deu outra volta no quintal e voltou...
Novamente a vovó Odete perguntou:
—Jaime você já fechou a porta?
---Não mãe, ele respondeu...
Então a vovó Odete ralhou com o tio Jaime e disse sacudindo ele para valer:
—Jaime, acorda, você já fechou a porta?
—Não mãe eu não achei a tesoura
E a vovó disse, pare de fazer graça Jaime e vai fechar a porta que tem um bêbado querendo entrar e fazer xixi na cozinha....
O tio Jaime, agora acordado disse:
--Eu não vou la não mãe, to com medo.

fim

Eduardo Soares de Macedo um geólogo com asas invisíveis e barba de profeta

Este é o Eduardo Soares de Macedo. Grande primo, Grande geólogo não apenas do IPT, do Brasil, do mundo. Ouvi historias inusitadas outro dia sobre ele. Ele é chamado quando há risco de queda de barreiras, desmoronamentos de encostas e tal. Certa vez, ele percebeu que havia um risco muito grande de uma familia ser morta pela queda de uma encosta. o diálogo, pelo que me contaram minhas fontes fidedignas foi mais ou menos o seguinte: -Minha senhora, tire seus filhos e seu marido daqui pois sua casa vai ficar soterrada. -O moço, eu num posso sai daqui. Só saio se Deus mandar alguém me avisar. -Senhora, Deus me mandou aqui para lhe dizer que sua casa vai cair e sua familia vai ficar soterrada. Então saia agora. -Então se é assim, eu saio. Se foi Deus que mandou o senhor me avisar eu vou. A mulher saiu e o marido torrão se negou. Disse que não saia nem na porrada. O Duda pediu a policia ou bombeiros , não sei ao certo, que o tirassem a força. Minutos depois a encosta veio abaixo e se eles tivessem ficado lá seriam totalmente soterrados. Este é meu primo Eduardo, um ser humano fascinante, sabe um pouco sobre tudo e ao mesmo tempo é especialista no que faz. Leitor voraz,o que deixa qualquer primo bibliotecário orgulhoso de falar dele.Pelo que sei sempre incentiva seus filhos a lerem. Outro dia liguei a TV no programa do Hulk, jovens inventores e quem estava sentado numa cadeira de jurados? O Duda. Eu chamei minha rainha e disse empolgado: Olha lá, é meu primo! O jovem havia pensado em uma forma de avisar as pessoas que moram em encostas do risco de desmoronamento antes que o mesmo ocorra. O Duda deu nota 10 e parabenizou o garoto. Eu não podia esperar menos. O rapaz veio da escola publica e conseguiu sair dela sem perder sua capacidade de repensar o mundo.Merecia mais que 10...mas o Duda só podia dar 10....só sei que foi assim. Grande abraço ao querido primo Duda e sua familia.

Isaias Alves dos Santos, um mago Baiano

Paisão. Saudades do meu amigo velho. Ele era um cara mágico, um mago. Um pagé, um matero, um índio. Sabia muito de plantas curativas, pena que eu não soube aproveitar isto e não anotei nada do que ele me falava. Ele éra crentovsky, mas falava umas coisas estrooonhas de vez em quando. Certa vez ele disse que teve um sonho, muito parecido com o real, ele quase podia afirmar que era real o que viu e fez. Disse ele que Jesus veio e o chamou, enquanto seu corpo dormia, para um passeio. Colocou-o numa nave espacial e viajaram por outras galaxias, coisa de louco. Eu, na ápoca, não me liguei e o achei mutcho loco. Mas hoje entendo que ele provavelmente fez uma viagem astral e não sabia o que era isto. Mas ele falava com os animais. Certo dia eu vi um beija-flor entrar no rancho em que ele morava e avançar umas três vezes na cara dele. Eu perguntei: Pai, porque este pássaro avançou na sua cara? Você cria passaros, ele é treinado? -Não Rudi, ele veio me avisar que alguém em São Paulo morreu. Você deixou alguém doente lá? -Sim, a vó estáva muito doente quando sai de lá. -Então, ela faleceu. Foi dito e feito. Liguei assim que pude para São Paulo e minha avó havia morrido. Eu acho isto mágico não é não? Ele não tinha porta nem janela na palhoça em que vivia. Não tinha medo de bicho, dizia ele, quem faz mal aos outros é gente. Bicho só quer viver em paz. Tem muitas tiradas do meu pai. Caiu num posso de 7 metros cheio de ferramentas e não se feriu. Quando um incêndio ia quemar a casa em que morava com minha mãe e os 3 filhos, ele ajoelhou no chão, ergueu os braços e pediu a Deus que parasse o fogo. Parentes meus viram depois e minha mãe contava que o fogo parou em volta da casa, sem motivo aparente. Ficou uma roda de capim que não pegou fogo a volta da casa, e o resto virou brasa. Ele era um cara de fé. Era um homem voltado para a vertical, não para a horizontal.Na horizontal temos o tempo, a vida comum que nos leva ao túmulo. Na vertical nos conetamos com o todo, com a eternidade e não nos importamos com o tempo nem com nada que seja externo a nós mesmos, á nossa consciência. Ele era assim. Um monge crente.Desapegado de coisas que não fossem excenciais .Vivia o momento, era plugado no todo, no universo e sentia prazer em ser apenas mais um capial do mato.Um zé ninguém. Este era meu pai.

Meu Pai, um homem chamado Isaias Alves dos Santos

Este era meu pai. Dormia de portas abertas. Não tinha medo de onça, tinha medo de gente. Foi dentro desta tapera que vi o beija-flor voar na frente dele lhe dando o recado que minha avó tinha falecido. Foi ai que passei duas férias incríveis no meio da mata rondonense. Foi nesta época que dei conta de que ele era especial no sentido de ter visões e ver o futuro. Não foi nesta viagem, mas na outra que fiz depois desta, anos depois, que ele me disse. Filho, vou morrer daqui ha um mês. Vou te mostrar as terras e você saberá onde estão as divisas. E realmente, depois de um mes exato ele teve um AVC dentro deste mesmo rancho. O levaram para a cidade de Vilhena, mas não havia recursos para tratá-lo lá. Mandaram a um alto custo de ambulância de vilhena para Cuiabá. Lá os médicos açougueiros mataram meu pai. Eles o liberaram antes de estar bem pra ir para casa. quando ele voltou ao hospital, depois de 2 semanas, super maus, eles o deixaram uma semana numa maca no corredor,entubado, disseram que foi por falta de vaga na UTI. Quando o puseram na UTI ele durou duas semanas e se foi. Esta foi uma passagem muito triste de minha vida.Ter que enterrar meu velho sozinho, com a ajuda de estranhos e num lugar desconhecido num cemitério de indigentes. Mas tenho certeza que ele foi para um bom lugar. Diz um livro que eu li chamado "viagem de uma alma" que o céu dos crentes realmente existe. chamam de "a cidade da luz" lá tem ruas de ouro e tudo o que a biblia promete. Pena que é um lugar de onde os adeptos não querem sair para conhecer os outros lugares que existem também. O inferno, ou o que chamam de inferno os crentes e a bíblia é uma área chamada de umbral. Lá aspessoas que se acham cheias de culpa e autocomiseração ficam até serem resgatados por seres da luz e irem para hospitais espirituais. Tem outras dimensões mais acima, tem 7 se não me engano. Até um dos apostolos disse que: Conheci um homem que não sei se no corpo ou fora do corpo, esteve no sétimo céu. Então há muito pra se ver depois que deixamos o corpo. Eu sei que realmente há porque estive fora do corpo algumas vezes e foi fantástico. Na verdade todos nós saimos do corpo toda a noite em sonhos, mas não lembramos de nada ou quase nada. Mas tá bom, Se meu pai estiver no céu tá de bom tamanho. recentemente me disseram que ele está comigo, que se tornou meu anjo da guarda. Por justiça ou algo assim. Acho justo. Durante minha vida ele tratou do básico para mim e fez o que bem entendeu da sua vida. Deixou-me com uma carga que era sua quando eu tinha 9 anos e muito antes do tempo em que eu deveria assumir uma familia, me fez ser um chefe de familia e trabalhar para sustentar a casa. Então, trabalha pai, como dizia a mãe, quem não trabalha com o sol, trabalha com a lua.Mas ele adorava trabalhar, deve estar gostando do além vida. Dizem que se você trabalha muito aqui, vai continuar trabalhando lá...que descanso o que....e que se vc não é chegado ao trabalho aqui, lá será menos ainda...então só vendo pra ver. té

Tio Heitor, um dos Einsteins da família

Tio Heitor Soares de Macedo. Este personagem importante tem que abrir meu blog de historias de familia. Afinal é o que mais historias me contou e me conta até hoje quando tenho o raro prazer de visitá-lo. Toda familia deveria ter um tio assim. Um cara inteligente, divertido, alegre e desencanado com o que os outros vão pensar de sua aparência, de sua casa, de seu carro etc. A historia que abre este meu novo blog nos leva a um tempo emque o tio Heitor ainda era um moleque. Ele sempre teve a inteligência dos mais inocentes e seu pensamento já estava acima da média desde criança. Nesta historia eu gostaria de mostrar, como diz OSHO, que a inteligência e a desobediência andam juntas. Fazer tudo o que os outros te mandam e nunca questionar não é nada inteligente. Também desobedecer por desobedecer é burro, há que se pensar no porque das coisas que lhe são ordenadas por outrem. Mas desobedecer por pensar e trazer pra si a responsabilidade dos seus atos não é ruim. Nada de desobedecer por raiva, porque seu ego lhe diz que é melhor, não. Desobedecer sim porque não lhe foi explicado o porque daquela ordem muitas vezes estupida mesmo. Pois é, sem mais delongas ai vai a historia da sábia desobediencia do tio Heitor. Minha mãe me contou esta história e faz muito tempo, portanto,me perdoem os leitores se não me ative a detalhes exatos, mas, em fim, é a minha maneira de contar. -Heitor, venha aqui que preciso de sua ajuda, disse Odete com um tom sério mas , sobretudo carinhoso. Odete amava muito Heitor, seu irmão. Ela era paraplégica e não podia andar em lugares onde o chão não era muito regular, por isto tinha que pedir a Heitor que fizesse aquele pequeno trabalho domestico. -Está vendo este caldeirão de feijão estragado? Bem meu querido, você pode jogar fora para mim pois se eu jogar perto da casa pode dar uma doença chamada tifo. -Mas, onde eu jogo isto? Disse Heitor em seu permanente estado de dúvida. -Sei lá menino, jogue bem longe da casa por ai. Naquele tempo não havia saneamento básico em toda a cidade e nem lixeiro ou coisa parecida que passasse periodicamente. Então o lixo orgânico éra um problema a ser descartado longe das casas para não acarretar doenças.Cá pra nós o feijão até hoje é chato pra descartar. Se vc põe no lixo comum vaza, se joga na pia entope, em fim, continuando... Heitor foi andando com o caldeirão de feijão e pensando: -Aqui tem o chiqueiro dos porcos. Bom, não posso jogar aqui. Coitados dos porcos, se eu jogo aqui poderão pegar tifo. Vou andar mais um pouquinho. Andou mais um pouco e encontrou um pasto. -Aqui também acho melhor não jogar, pois as vaquinhas podem pegar tifo. Vou ver se jogo mais pra frente. Chegou a um rio que passava perto do pasto, olhou o rio correndo. Agua barrenta, mas viu logo a frente algumas vacas bebendo água . -No rio também não vai dar, acho que se jogasse aqui as vaquinhas iriam se por doentes e também as lavadeiras que lavbam roupa na beira do rio poderiam pegar tifo. E assim Heitor continuou andando por horas pensando em como resolveria seu problema. -Enterrar também não dá porque as minhocas pegariam tifo. Dai eu ia precisar de minhocas para pescar e o peixe ia comer a minhoca tifada e depois a gente ia comer o peixe e pegar tifo. Na rua também não dá porque os cachorros podem comer e pegar tifo... No fim da tarde Odete já estava para chamar algum dos outros irmãos para sair atras do Heitor. Ele havia saido com o caldeirão de feijão estragado pára jogar fora e nada. Nem sinal de Heitor voltar.Odete passara o dia inteiro preocupada com o irmão que nem voltou pro almoço. Onde estaria ele, devia estar com fome. O que será que havia ocorrido. Por fim, para alivio de Odete, o pequeno Heitor voltou para casa com o caldeirão. -Menino, onde é que você passou o dia inteiro? Precisei do caldeirão para fazer comida e você não trazia de volta nunca. Odete pegou o caldeirão de feijão e viu que o feijão estragado ainda estava no caldeirão. -Menino, não te pedi para jogar este feijão fedido fora? -Sim, respondeu Heitor, mas eu não pude jogar em lugar nenhum porque eu ia pensando: Se jogo no chiqueiro os porcos pegam tifo, no pasto as vacas pegam tifo, no rio as vacas os peixes e nós pegamos tifo, na rua os cachorro podem comer e pegar tifo. Dai eu trouxe de volta porque realmente não sei onde jogar este feijão. Odete passou da perplexidade ao riso e abraçou o irmão. -Daqui Heitor, deixa que eu peço para o Wilson jogar. Creio que a inteligência é isto. Algo que parece tão estúpido mas tem um fundamento tão profundo quando você analisa de perto. Olha as noçoes de cadeia alimentar, de higiêne, de amor aos seres vivos que esta criança passou nesta simples desobediência inocente. Aproveito para contar uma historia que Osho me contou hoje. Em seu livro "inteligência" ele disse que em sua escola, quando ingressou no mundo das letras, era proibido ficar sem boné. Todo mundo tinha que usar boné porque era regra da escola. Osho foi sem boné e, logo que entrou na sala de aula o professor lhe disse: "...."vocÊ parece muito estranho. Está escrito no regulamento da escola que nenhum aluno pode entrar aqui sem boné." Repliquei: "Então este regulamento precisa ser alterado. Ele foi escrito por seres humanos, não por Deus, e seres humanos se enganam." O professor não pode acreditar e disse: " o que há com você? porque não pode simplesmente usar um boné?" Respondi: "o problema não é o boné; quero descobrir porque ele é obrigatório, sua razão, suas consequências. Se você não for capaz de me explicar, pode me levar ao diretor e poderemos discutir sobre isto. Ele teve de me lavar ao diretor." Na India, segundo explica Osho, os Bengalis são as pessoas mais inteligentes e não usam nada na cabeça. já os Punjabis são os menos inteligentes, pessoas simples e usam turbantes. Continuando a fala de Osho: "Assim eu disse ao diretor: "olhe a situação, os Bengalis não usam bonés e são as pessoas mais iteligentes do pais. os Punjabis usam um turbante espesso que certamente é mais do que um boné e são menos inteligentes.Se este regra realmente tiver a ver com ter ou não inteligência, prefiro não correr o risco." O diretor me escutou e disse: "O menino é teimoso, mas o que ele está dizendo faz sentido." Daqui para a frente quem quiser usar boné pode usar, mas quem não quiser não precisará mais porque isto nada tem a ver com a aprendizagem". E assim ninguém mais da escola usava bonés, apenas o professor torrão. Um dia Osho lhe falou: Professor, se o senhor me disser porque usar boné me faria mais inteligente eu uso não só um mas 3 deles. O professor então em fim resolveu não utilizar mais o boné mas disse a Osho: "menino, você vai ter muitos problemas para se ajustar na vida" (parafraseei e resumi algumas coisas para encurtar e ser possivel contar a história). O importante é que desobedecer tem consequências e não é fácil Se você simplesmente obedece, não tem que arcar com as consequências dos seus atos, ao menos você tem esta ilusão. Desobedecer carece de amor e paciência para explicar porque você não fará determinada coisa ou não cumprirá determinada ordem.Sem raiva, sem ego. Apenas para se fazer entender.